A
campanha eleitoral vai ganhando corpo e os eleitores são confrontados
com os muitos pretendentes ao seu voto. Por enquanto, os
“presidenciáveis” são colocados em maior evidência e quase não nos
damos conta de que também estão em jogo os cargos de governador,
senador, deputado federal e estadual.
Nas
questões gerais, todos os gatos parecem pardos. Os candidatos mostram
seus planos para a economia, a saúde, a educação, a segurança, o
transporte, o meio ambiente… De todos é esperado que tenham ficha
limpa, sejam honestos e transparentes no exercício do poder, promovam o
bem comum e não apenas o de alguns setores da sociedade. Cabe ao
eleitor ouvir, discernir e escolher os cidadãos probos, capazes de
governar e legislar com sabedoria e prudência.
Mas
deveriam merecer atenção especial os projetos de partido e o rumo que
se pretende imprimir ao país. Votamos em candidatos, mas quem dita as
regras é o partido. Qual é a ideologia do partido e sua proposta para o
exercício do poder? As diferenças entre os partidos e os candidatos
aparecem especialmente nas políticas públicas que desejam desenvolver.
Os
eleitores querem saber, e têm esse direito, sobre quais serão as
políticas sociais para a superação das gritantes desigualdades e o
alcance da equidade e da justiça social, como convém a um país que se
pretende grande na economia e importante no cenário internacional. Como
se posicionam candidatos e partidos sobre os direitos humanos
fundamentais? Parece questão pacífica, mas não é, pois nem tudo é claro
nos programas de direitos humanos. A questão não pode ser deixada
apenas à ação de grupos de pressão, nem ao cálculo de conveniências nas
relações internacionais. Por falar nisso, qual será a posição do futuro
governo nas questões de política externa? E quem serão os amigos
preferenciais do Brasil?
Poucos
duvidam da importância da família para a pessoa, a sociedade e a nação.
No entanto, a família não é tema de debates políticos. Estudos
sociológicos têm demonstrado que a ausência da família, ou a
impossibilidade de cumprir a missão que lhe é própria, está na origem
de graves males; quando um governo descuida e desprotege a família,
deixa uma herança pesada de problemas à sociedade e chama a si muitas
responsabilidades que poderiam ser bem melhor assumidas pela família,
que tem um papel social insubstituível; por isso ela merece toda a
atenção dos governantes e legisladores. Não seria hora de ter no
Governo brasileiro um Ministério voltado para as questões da família?
A
família precisa de políticas públicas para o acesso à moradia digna,
alimentação e educação de qualidade. O trato privilegiado da saúde
materna e infantil seria um investimento de elevado retorno social; a
adoção poderia ser mais incentivada; a educação sexual não deveria ser
desvinculada da formação para atitudes eticamente e socialmente
responsáveis, nem dos valores do casamento e da família bem
constituída, condições para acolher bem os novos brasileirinhos. Será
que é bom para o futuro do país que um percentual elevado de crianças
nasça fora de uma família constituída? Que a sustentação e educação do
filho fique a cargo de um dos genitores apenas? Os programas de
repressão da natalidade levaram o Brasil a uma queda brusca do número
de filhos por casal e isso foi celebrado como um avanço importante.
Seremos, em breve, uma população de idosos, como já acontece em outros
países, e os governos precisarão fazer políticas de incentivo à
natalidade…
Questão
espinhosa para os candidatos é o pleno respeito à dignidade da pessoa e
à sua vida em todos os momentos do existir. Questões como o aborto, a
eutanásia, a manipulação de seres humanos nas pesquisas científicas
acabam sendo evitadas, ou tratadas de maneira evasiva: “Vamos tratar
disso como questão de saúde pública…” “Vamos submeter a um plebiscito…”
O direito à vida não pode ser submetido ao arbítrio da maioria. O
aborto deveria, sim, ser tratado como questão de saúde pública, mas
para melhor proteger a vida dos nascituros contra toda agressão,
amparar as gestantes, dando-lhes condições de levar a gravidez até o
fim e de dar à luz com dignidade a seus bebês. Gravidez e maternidade
não são enfermidades! Mas se, por saúde pública, é sinalizada a
facilitação ou a legalização do aborto, não estamos mais diante de uma
política de saúde. Inútil abrandar as coisas com conceitos como
“despenalização do aborto” ou “antecipação do parto”. A crua realidade
não muda e o aborto voluntário é sempre a supressão direta da vida de
um ser humano.
Política
pública de saúde seria também a aplicação da lei em vigor, fechando as
clínicas clandestinas de abortos e penalizando os responsáveis! Seria
ainda a oferta de apoio efetivo às gestantes em dificuldades, bem o
chamado à responsabilidade do pai biológico e o cumprimento da lei em
vigor, no que se refere à proteção e defesa da mãe e do filho ainda por
nascer. Com freqüência ouvem-se cálculos, de fato nunca comprovados, de
que no Brasil os abortos clandestinos seriam mais de um milhão por ano.
Um milhão de seres humanos eliminados antes de nascer! E, com eles,
muitas mulheres morrem ou levam problemas para o resto da vida! Isso
deveria merecer alguma atenção política!
Os
candidatos aos cargos de deputado federal e senador, se eleitos, terão
a responsabilidade de fazer leis sobre essas questões. Suas posições e
as de seus partidos, sobre o assunto são conhecidas? Os eleitores têm o
direito de saber, para votar conscientemente.
Card. Dom Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo
Artigo publicado em O ESTADO DE SÃO PAULO, dia 14.08.2010
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